“Aprendendo com a microcefalia,
superando desafios e preconceitos”. Esse foi o tema da audiência pública
realizada na tarde desta quinta-feira (19), na Assembleia Legislativa do RN.
Proposto pela deputada Cristiane Dantas (SDD), o debate teve como objetivos
evidenciar questões importantes e analisar os melhores caminhos para o Poder
Público direcionar suas políticas públicas, planejar e dispor recursos para um
atendimento mais digno a essa parcela da população.
Segundo Cristiane Dantas, desde 2014,
quando o Brasil vivenciou o surto dos casos de microcefalia nas crianças,
especialmente nos estados do Nordeste, muitas incógnitas surgiram. “Passados
quatro anos, ainda existem dúvidas sobre a real origem da malformação congênita
que afeta o desenvolvimento do cérebro dos bebês. Contudo, a teoria mais aceita
até o momento e fonte de muitas pesquisas, é a de que a microcefalia está
associada ao surto do Zika, vírus transmitido pelo aedes aegypti, que também
transmite dengue e chikungynia”, disse.
Enriquecendo o debate com dados da
Secretaria Estadual de Saúde, a parlamentar informou que, entre 2014 e 2019, o
Rio Grande do Norte registrou 541 casos suspeitos de microcefalia por Zika e
outras malformações relacionadas a infecções congênitas, como sífilis,
toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus e herpes vírus. “Esses casos foram
registrados em 100 municípios do RN, com 151 confirmados, 131 sob investigação,
247 descartados e 4 inconclusivos”, complementou.
Outra estatística trazida pela
deputada, divulgada pelo Ministério da Saúde no dia 11 deste mês, aponta o Rio
Grande do Norte como o segundo estado do País em número de casos notificados de
Chikungunya e Zika. “Sobre a Zika, o boletim das arboviroses urbanas do
Ministério da Saúde apontou um crescimento de 111,5% dos casos entre 2018 e
2019, passando de 445 para 941 ocorrências. Isso é um alerta de quem um novo
surto de microcefalia não é algo irreal”, alertou.
Iniciando os discursos dos membros da
Mesa, a Subsecretária de Direitos Humanos, Maria Luiza Tonelli, disse que
“primeiro é preciso pensar nessas crianças como sujeitos de direito; elas têm
direito a saúde, lazer, educação inclusiva, enfim, todos que as outras crianças
possuem. Também temos que lembrar das mães, porque sabemos o quanto é difícil a
vida de uma cuidadora de criança com microcefalia”.
Maria Luiza também garantiu que a
secretaria está de portas abertas e dialogando com o Ministério Público e a
Assembleia Legislativa, em prol da melhoria da qualidade de vida das crianças e
seus familiares.
Falando em nome de todas as mães,
Maria da Guia dos Santos, presidente da AME (Associação das Mães Escolhidas por
Deus), emocionada, contou um pouco da história com sua filha, Maria Vitória.
“Eu estava no salão de beleza e
conheci uma mãe que teve um bebê e o havia abandonado. Eu não pensei duas vezes
e decidi ficar com Vitória para mim. Quando os médicos me falaram que ela era
uma criança especial, eu olhei para ela e vi apenas uma menina que precisava de
cuidados, porque as mães não escolhem os filhos e não olham seu diagnóstico.
Todas nós fomos escolhidas por Deus para cuidar desses bebês, independente do
problema que eles têm”, desabafou.
Maria da Guia destacou que ela e as
outras mães não querem dinheiro, e sim, carinho e atenção. “A gente não quer
dinheiro. Dinheiro é consequência. O que a gente quer é atenção, ser vista e
ouvida. Precisamos que olhem com carinho para a nossa causa. Eu, por exemplo,
quando peguei Vitória, ela não tinha quase nenhuma chance, porque ela havia
tido infecção generalizada. E hoje ela está aí, firme e forte. Fica em pé, já
enxerga, fala algumas palavras. E o que curou ela foi, principalmente, todo meu
amor, cuidado e carinho”, disse.
Por meio de vídeo enviado de Brasília,
o senador Styvenson Valentim divulgou dados estatísticos a respeito do tema e
falou da importância da prevenção, do controle e das políticas públicas para
combater a microcefalia. “Prevenção é a chave de tudo. O pré-natal é muito
importante. Além disso, é preciso combater o mosquito vetor da doença com ações
de conscientização da população. Eu sei que é difícil, mas é por isso que vocês
estão aí, para encontrar soluções. E nós estaremos sempre à disposição para
lutar com vocês”, comprometeu-se.
O deputado Hermano Morais lembrou que
é necessário prover mais assistência às famílias, parabenizou os pais e
familiares pela dedicação e deixou seu mandato à disposição para ajudar na
garantia da saúde e de uma vida digna às crianças com microcefalia.
Dando continuidade às apresentações da
Mesa, a dentista e professora Cristina Lúcia falou da sua pesquisa e do
trabalho sobre saúde bucal que vem realizando junto às crianças com
microcefalia em várias regiões do País, inclusive no RN. Cristina Lúcia mostrou
também algumas maneiras de se ajudar as mães das crianças acometidas pela malformação.
Defensora pública do Estado, Cláudia
Queiroz falou da obrigatoriedade do Poder Público em promover o direito a
saúde, educação inclusiva e moradia às famílias com crianças portadoras de
microcefalia.
“A Defensoria Pública do RN estará
sempre lutando ao lado dessas crianças e seus familiares. Essa batalha não
cessa, mas sempre vale a pena. Temos que buscar o melhor para os nossos filhos,
dar o melhor para eles, sempre”, disse.
A defensora pública ainda aconselhou
os familiares a não se conformarem com um ‘não’, com a falta de terapia
ocupacional, com a inexistência de um prestador de serviço em determinada rede
de atendimento, com a falta de passagens para as consultas. “Prestar todas
essas assistências a vocês é dever do Poder Público. Vocês podem e devem cobrar
seus direitos”, esclareceu.
Por fim, a chefe do ambulatório do
Centro Especializado em Reabilitação do RN, Suily Alencar, fez uma explanação
acerca das instalações e de todo o trabalho executado nesses centros de
reabilitação, tanto infantis quanto adultos.
“Lá no Centro Ítalo Targino, por
exemplo, nós temos quase 200 profissionais e quatro mil metros quadrados de
estrutura, que abrigam serviços médicos e de odontologia, próteses, nutrição,
atividades educativas, laboratórios de pesquisa, dentre outras atividades”,
explicou.
Suily Alencar falou também que a ajuda
profissional é importante, mas “quem reabilita mesmo são as mães, em casa”.
Sobre as perspectivas do centro, ela disse que estão previstas a conclusão da
reforma estrutural, a aquisição de novos equipamentos, a construção de oficina
ortopédica e a habilitação oficial para executar a reabilitação em doenças
raras.
Participaram ainda da audiência
pública outros órgãos e instituições ligados ao tema.